EVANGELHOS APÓCRIFOS E INQUIETAÇÃO HUMANA
(31/01/2005)

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No tempo dos discípulos, o nascimento e a morte de Jesus eram encarados com naturalidade, tanto pelos adeptos como pela população em geral. Posteriormente, adveio um dogmatismo que obscureceu toda a simplicidade e naturalidade dos fatos reais.

Em meio à incoerência das teorias apresentadas, chegamos ao século 21. Foi um longo período de uma só verdade imposta aos seres humanos os quais tinham de aceitar tudo sem que lhes fosse permitido questionar nada. Enfim, mais e mais vai tomando forma a inquietação e insatisfação de muitas pessoas que querem algo mais do que as respostas disponíveis, buscando informações que possam, pelo menos, ser aceitas pelo raciocínio lúcido.

Neste momento de muitos riscos que afetam toda a humanidade, como alterações climáticas, epidemias de doenças infecciosas, e terrorismo, só para citar alguns, grandes transformações universais estão se processando a despeito de serem reconhecidas ou não. Enfim, os seres humanos estão percebendo que, para encontrar as respostas, deverão buscar pelo Santo Graal, com sinceridade e dispostos a examinar objetivamente os fatos.

Com freqüência as pessoas estão indagando quem realmente era Jesus e qual era a sua real missão. Qual a verdade sobre a geração de seu corpo terreno, já que pelas leis naturais do Criador, a fecundação é indispensável.

Os ensinamentos de Jesus foram dados para o ser humano em geral, independentemente de sua formação religiosa. Assim como não se envolveu com as seitas dos fariseus, saduceus, e essênios que viviam na Palestina. Também não se pode considerá-lo como exclusividade da igreja romana que se cristalizou sob o comando do imperador Constantino, que estabeleceu com os seus bispos, no terceiro século, os fundamentos da nova religião que teria alcance global no mundo daquela época.

Constantino conseguiu, com a religião criada, aquilo que Alexandre tentara em vão alguns séculos antes com o poder das armas. Criando um império universal, mediante a imposição de uma doutrina oficial que deveria ser aceita sem restrições pelas populações, Constantino estabeleceu as bases para o maior império jamais alcançado anteriormente.

Mas teria sido essa a missão de Jesus? É o que muitas pessoas estão perguntando. Contudo, Jesus afirmara: este não é o meu reino. Então, o que Jesus realmente queria ensinar? Que o reino da matéria é perecível, porém imprescindível para o fortalecimento e desenvolvimento do espírito, e que a verdadeira vida está no reino espiritual.

Durante muito tempo foi aceita a hipótese de que Jesus não falou mais nada durante o indecoroso julgamento, para assim entregar a sua vida como sacrifício pelos pecados da humanidade. Atualmente, essa idéia começa a despertar um certo desconforto e incredulidade nas pessoas que estão raciocinando com lucidez. Como o sacrifício de um inocente poderia perdoar a humanidade pecadora? Onde repousa nisso a justiça?

No livro Jesus a Verdade e a Vida, o prof. Fida Hassnain, escreveu que, segundo os manuscritos encontrados no mar morto, quando Jesus estava instruindo seus discípulos no templo, um deles teria perguntado: “O sangue dos sacrifícios pode lavar os pecados?” Ao que Jesus teria respondido: “O sangue dos sacrifícios de animais ou homens não pode nunca lavar os pecados nem a falta pode ser erradicada pelo derramamento de sangue inocente.”

O nascimento de Jesus era encarado com naturalidade pelos adeptos, sem o obscurantismo dogmático que veio depois. Já a forma brutal como lhe foi tirada a vida, era percebida como uma perfídia, o selo da recusa da humanidade aos ensinamentos espirituais, que dispensavam a intermediação de organizações religiosas.

Atualmente a busca de um conhecimento mais realista sobre a vida de Jesus se defronta com a dificuldade do desaparecimento dos documentos que poderiam auxiliar na elucidação. A humanidade está procurando entender os acontecimentos do passado e os fenômenos da atualidade, que o raciocínio não consegue explicar.

Rica Montenegro, escreveu para a revista Super Interessante (12/2004), o artigo “Um outro Jesus”, baseada no fato de que os evangelhos apócrifos, textos que foram proibidos e ficaram desaparecidos por mais de um milênio, mostram um Jesus diferente daquele que conhecemos. Segundo suas pesquisas nada é mais importante que a sabedoria, e que o autoconhecimento é o caminho para a sabedoria. Essa idéia – que não é muito diferente daquilo que prega o budismo – está completamente ausente dos evangelhos de Mateus, Marcos, João e Lucas. Qualquer bom cristão sabe que o Novo Testamento oferece um caminho de só duas pistas para a salvação. Primeiro: é preciso ter fé (ela remove montanhas). Segundo: as ações têm que ser boas (ame o próximo como a si mesmo). Em nenhum lugar há referência à outra rota para o Paraíso. Nem Lucas, nem Marcos, nem Mateus, nem João, mencionam a salvação pelo autoconhecimento, ou pela sabedoria.

A jornalista complementa escrevendo que, se o cristianismo tradicional ignorava a importância do autoconhecimento, a idéia não é nova para nós do século 21.

Contudo, é imperioso conhecer-se a si mesmo para, simultaneamente, conhecer a profundidade de todas as coisas, vale dizer da própria vida. O conhecimento de si mesmo deve necessariamente passar pelo reconhecimento do espírito, como o núcleo realmente vivo no ser humano.

De fato, a principal finalidade dos ensinamentos de Jesus era a conscientização dos seres humanos do significado espiritual da vida, mas isso não foi bem compreendido e, posteriormente, suprimido por outras noções mais próximas ao entendimento do raciocínio terreno.

Os seres humanos deverão chegar ao reconhecimento de que não foram capazes de compreender os escritos da Bíblia, que dá esclarecimentos sobre fenômenos espirituais, confundindo tudo em sua mente restrita.

“Deus é Divino, Sua Vontade é espírito. E dessa Vontade viva originou-se o Paraíso com seus habitantes. Desse Paraíso, porém, adveio a criatura humana como semente espiritual, a fim de prosseguir no percurso pela Criação ulterior. O ser humano é, portanto, portador de espírito no conjunto da Criação material. Por esse motivo se encontra em suas ações atado à pura Vontade primordial de Deus, devendo assumir toda a responsabilidade para tanto, se deixar que esta fique impuramente coberta de todo por influências externas da matéria e, sob certas circunstâncias, soterrada temporariamente de modo total. É o tesouro ou o talento que em sua mão devia dar juros e mais juros.” (Abdruschin - Mensagem do Graal, Vol. 2, Espírito).

Figurativamente, os juros corresponderiam ao continuo aprimoramento e embelezamento da vida no Planeta, como meta do ser humano espiritualizado. Mas, tendo enterrado o talento, deixando seu egoísmo agir livremente, construiu um mundo caótico e cheio de riscos que ameaçam toda a humanidade.