ELEIÇÕES
(30/09/2002)

A eleição é o processo através do qual são escolhidos os dirigentes governamentais mediante os votos atribuídos pela população. Sem dúvida se trata de um momento de grande significação, mas que também não ficou livre das intervenções movidas pelo egocentrismo humano, e por isso mesmo não atingiu a plena florescência, dando margem a casuísmos e manipulações do indolente ser humano. Atualmente isso decorre das interferências promovidas pelos mercados, essa figura abstrata que na realidade representa os interesses daqueles que detém o poder e que estendem a sua interferência sobre todas as atividades humanas, visando de forma prioritária a geração de lucros crescentes e a manutenção da concentração das riquezas acumuladas. Quem tem riqueza está sempre em busca de mais. Isso é inerente ao mercado e suas instabilidades. Inseguros e temerosos os seres humanos buscam a segurança na contínua acumulação da riqueza como finalidade principal de suas vidas.

Não há o que estranhar quanto ao interesse do mercado. Posto que os governos soberanos acabaram se tornando excelente fonte de negócios lucrativos. Quando há eleição, os candidatos e suas proposições são meticulosamente examinados pelo mercado o qual é avesso ao risco. Busca sempre pelo ganho, o alto ganho. E quando não há condições para isso, retira o seu capital sem a mínima preocupação.

Para debelar a inflação o Brasil estabeleceu um plano monetário e cambial que deixou de lado o aspecto do fluxo de câmbio, criando-se uma situação na qual os encargos superavam as receitas. Assim o déficit foi sendo coberto com a venda de estatais e a aquisição de empresas rentáveis pelo capital externo. Muito pouco foi feito para o aumento das exportações, enquanto de outro lado, esgotadas as alternativas de ingresso de capitais, restaram os empréstimos normais e a abertura ao capital especulativo.

Com o agravamento da situação internacional, também subordinada às oscilações do artificialismo econômico, a crise se foi instalando, tornando-se evidente a fragilidade do sistema. Decorrido o longo período de plena sintonia com o FMI, agora, às vésperas das eleições, a imprensa estampa as declarações de Stanley Fischer, ex-vice-diretor do Fundo: “todo dia que passa torna a dívida brasileira mais difícil de administrar”. Assim armou-se uma situação de dependência muito delicada para a própria sobrevivência da nação.

Surge concretamente o risco político de se cristalizarem as discrepâncias entre as autoridades que forem eleitas e o mercado, levando o País para uma situação imprevisível. Além disso surge o esmorecimento das esperanças de mais uma geração num rude golpe que conduz ao enfraquecimento geral.

A inflação foi mantida sob controle, mas o real sofreu uma brutal depreciação que em ultima análise significa o empobrecimento geral da população. Assim, tudo ficou desvalorizado. Propriedades, empresas, trabalho. Uma situação cuja resultante era fácil de ser prevista, e no entanto mantida até ao seu lamentável desfecho. Agora surge a necessidade de um superávit ainda maior, o que somente será alcançado a custa de aumentados sacrifícios.

Esgotadas a possibilidades de financiamento outras alternativas foram sendo postas a disposição das exigências do mercado na tentativa de driblar a fragilidade. Para uma economia debilitada, é sempre temerária a venda de papéis indexados ao dólar e com juros elevados. É o tipo de operação que atrai os especuladores. É como deixar sopa para mosquitos. O que deveria ser um seguro, uma proteção para os devedores em dólar, acabou sendo um prato cheio para os especuladores que fizeram mais uma festa no banquete Brasil. E não deu outra. Ao se aproximar a data dos resgates o dólar foi às nuvens. Ganância infecciosa? Ignorância? Medo? Oportunismo? Ingenuidade?

O fato é que para o fabuloso ganho de uma minoria, toda a população terá de responder pelo aumento dos encargos da dívida. E nesse cenário, surgem as incógnitas e incertezas do processo eleitoral, lançando sombras sobre o futuro do País. Esses fatos não passam desapercebidos do eleitorado. Frustrado com essa situação, que tipo de escolha poderá fazer?

A eleição exige muito discernimento da parte dos eleitores, contudo o processo tem sido conduzido em clima passional, com o predomínio das agressões verbais e muita propaganda astuciosa, sem que se vislumbre uma objetividade na análise das causas e nos remédios aplicáveis para salvar o paciente. Assim corremos seriamente o risco de seguir as pegadas da Argentina indo parar na UTI, estagnando como País, apesar das enormes potencialidades.

Esperemos que o eleitorado seja inspirado em sua escolha para que sejam escolhidos aqueles que tenham um real empenho na busca da construção de uma nação verdadeiro lar de seres humanos, para que possamos evoluir em paz e alegria. Nosso lar, nosso doce lar!